quarta-feira, novembro 29, 2006

Poema a nove mãos

mas como eu gosto de dedicar as coisas:
poema a nove irmãos.


A chuva cessou
No peito alegre da menina
Triste
Mas as poças ficaram
Nas moças coisas ficam
Espelhando o novo céu que se abre
Espalhadas pelo chão, nesgas e nuvens
Que refletem mais que meu rosto
Desgosto, dizem, infiéis tormentas
Lamentos pelo caos que a tempestade
Deixou
Tantas rachaduras no asfalto
Tantas poças inspiradas pela chuva
Que o mundo escorrem
E escorrem...
Por dedos descuidados
Por vidas que se correm
Nos tempos que nos morrem
Pra chovermos noutras bandas
Umidade do mundo, por onde andas?

***
escrito durante o 1º encontro de blogueiros na boa compania de Marla, Jardim, Lasak, Tahkren, Fejones, Octávio, Keila, Ellemos e Sandra.

terça-feira, novembro 28, 2006

Simples

E no fim das contas eu acho que não quero morar mais em lugar ninhum

Mas se ocês quisé

A gente podia ir morar tudo num balão

Daqueles grandão que leva 80 dias pra rodá mundo

E na noite de reveillon,

Nóis pode seguir o fuso-horário

Deixando a trilha de fogos trás da gente

Só pra passar um dia inteiro

Na meia-noite.

Toda manhã depois do café,

A gente esvazia no ar as migalha de pão

Só pra mudar a rota

Da migração dos pássaro.

E em dia de tempestade e de truvão

A gente fecha as lona da cesta

Que é pra chuva num entrá

E nóis acende uma lamparina

Que é pro povo lá embaixo

Achá que nosso balão já foi

de festa junina.

Em vez de lastro d´areia

Nóis pode usá purpurina

E fazê chuvê

as chuva mais bonita...

E se num tive nada mió

Pra gente fazê lá no céu

Nóis dobra um milhão

E duzentos

Passarim de papel.

segunda-feira, novembro 20, 2006

curtelhas (3)

adoce sua imaginação
com geléia
real

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Me irritam os tais especialistas do tempo, que chamam a chuva de precipitação. Tolos! Não é nada precipitado. É o resultado de um plano há muito elaborado pela sociedade secreta das poças d´água.

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que presunçoso a gente é!
achar que é outro dia
só porque tomou café...

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e me perguntaram: menina, não dói?
Dói. Mas é dorzinha boa.

quarta-feira, novembro 15, 2006

Pralineè

Nela eu invejo
Essa capacidade de extravasar e transparecer tudo que está sentindo
ou quem sabe
essa incapacidade de fazer o contrário.
Nela eu admiro
essa coragem de por as entranhas pra fora
e de sentir cada sentimento,
por que os sentimentos são dela e às vezes não há nada que se possa fazer
que não seja dá-los a alguém.
Dela eu queria
essa força para deixar que lhe abram um olho mágico
por onde alguém possa
a espiar por dentro.

sexta-feira, novembro 10, 2006

uma questão de quando e onde

Bonito era ter nome de lugar, não de data, como o meu (tentei avisar mamãe de dentro da barriga, mas acho que não adiantou). Um nome que representa algo sempre ali, não um dia do ano. Não uma tradição secular, mas algo vivo e mutável e, ah, tão mais belo! Um nome que implicasse a multidão que habita cada um, tudo que se edifica e se destrói num fluxo constante de coisas e seres. Queria mesmo era ter nome de lugar.

Se eu me chamasse Paris, eu seria elegante, culta, triunfal. As pessoas que me conhecessem diriam espantadas: “menina-luz!” .

(Se eu me chamasse Escócia, teria um fraco por homens de saia. E ninguém gostaria de mim antes de eu ter 8 anos)

Se eu me chamasse América, eu seria espalhafatosa e indomável. Colossal. Acolhedora. E as pessoas que me fossem apresentadas não resistiriam a um sorriso e às palavras “ Descobri a américa!”, desconcertadas quase de imediato com a tolice do trocadilho.

(Se eu me chamasse Veneza, meu sangue correria em canais e seria navegado pelo amor em minúsculas gôndolas.)

Se eu me chamasse Roma eu seria imemorial, eu comeria mais massas, eu andaria torta e congestionada. Se eu me chamasse Roma, eu seria o inverso do amor.

(Se eu me chamasse Geórgia -o país, não o estado- seria ainda mais estranho ter nascido no mesmo dia que Stalin.)

Se eu me chamasse Rússia eu daria dois litros de vodka a cada elefante. Eu seria brava e dona de muitos chapéus. Se eu me chamasse Rússia, faria mais sentido a minha parte Cirílica.

(Se eu me chamasse Flórida, eu seria muito infantil. Se eu me chamasse Amsterdã, eu seria interpretada por Leonardo deCaprio)

Se eu me chamasse Brasília, eu seria branca e calculista. Planejada. Ah, sim. E estariam sempre me confundindo com aquela tal de Buenos Aires.

( Se eu me chamasse Dinamarca, eu teria um cachorro enorme)

Mas eu me chamo Natal. E eu só aconteço em dezembro.

segunda-feira, novembro 06, 2006

curtelhas (2)

Porquê o dia clareia, antes mesmo de amanhecer.

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É meio como acreditar em fadas. Mas acho que eu acredito. Não em fadas, nessa outra coisa. É leve e é bonita e é cheia de purpurina. Como as fadas. Se eu morder uma fada, aposto que explode purpurina. O mundo não é muito legal com as pessoas que acreditam em fadas. Porquê é infantil e é ridículo, e não é algo que as pessoas de respeito devam fazer. Mas, ora, foda-se o respeito. Apesar de que foda-se não é uma expressão que as fadas aprovariam. Elas gostariam mais de algo em francês, imagino. Mas no fim das contas, já não importa se o mundo vai ser legal comigo ou não. A gente acredita e as coisas ficam melhores e mais bonitas, então realmente não importa. Meio que como acreditar em fadas.

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Talvez eu não passe de um peixe de aquário.
Algo para se olhar através do vidro.

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Não durma. A noite é uma criança, e você sabe, não se deve deixar as crianças sozinhas.



quinta-feira, novembro 02, 2006

realidade absurda (3)

café da manhã. olho pro lado e vejo meu pai, café com leite recém mexido. Põe a colher sobre o prato, se inclina sobre ela e diz:
- satisfeito? encheu a cara de leite?
E eu sorrio, claro. ele continua:
- pois é, se ferrou.

E eu:
- quê?
- ah, não, é que tinha um insetinho na colher.
Olho mais de perto e, sim, um minúsculo bicho de asas ainda está se mexendo ali. Não creio que seja do tipo que gosta de leite.